Resultados preliminares de testes com vacina russa são divulgados

Publicado em prestigiada revista científica, estudo foi realizado nas fases iniciais de desenvolvimento da Sputnik V, que está entre as favoritas no combate à Covid-19

Com informações da BBC News Brasil

Matéria atualizada em 6 de setembro de 2020, às 23h17


Durante 42 dias, 76 voluntários receberam a vacina nas duas primeiras etapas
Fundo de Investimento Direto da Rússia/Reuters


Os resultados preliminares de um estudo que envolveu testes com a vacina russa Sputnik V – uma das favoritas no combate ao novo coronavírus – foram publicados nesta sexta-feira (4) na revista britânica The Lancet, uma das publicações científicas mais prestigiadas do mundo. Ao longo de 42 dias, 76 voluntários foram submetidos a experimentos com o imunizante nas suas duas primeiras etapas de desenvolvimento.

A vacina está sendo desenvolvida pelo Centro Nacional de Investigação de Epidemiologia e Microbiologia, o Instituto Gamaleya – órgão vinculado ao governo da Rússia –, junto ao Ministério da Defesa do país. Na avaliação dos autores do projeto, que integram os quadros da instituição, “não houve resultados adversos” do fármaco entre as pessoas que o receberam, conseguindo “provocar uma resposta imunológica” contra o vírus transmissor da Covid-19.

Em cada estágio dos testes, a Sputnik V foi aplicada em 38 adultos saudáveis, com idades entre 18 e 60 anos. Na primeira fase, cientistas do Gamaleya verificaram a segurança do produto, sem provocar efeitos colaterais, ao passo que na segunda eles disseram ter detectado sua eficácia. Os resultados, conforme os estudiosos, sugerem que a vacina produz no espaço de 28 dias uma resposta das células T, um mecanismo de defesa do corpo humano.

Como o imunizante russo se trata de uma vacina de vetor, o material genético do novo coronavírus é transportado por um vírus inócuo, denominado “não replicante” – ou seja, que não consegue se reproduzir, a fim de estimular a produção de anticorpos que inibem o contágio pelo Sars-CoV-2.

Dois vetores de adenovírus são empregados na produção da vacina – o adenovírus humano recombinante tipo 26 (rAd26-S) e o adenovírus humano recombinante tipo 5 (rAd5-S) – e foram modificados para expressar a proteína S, usada pelo novo coronavírus para penetrar em suas células e infectá-las. Os adenovírus utilizados nas amostras precisaram ser enfraquecidos visando a impedir a sua replicação nas células humanas – pelo contrário, causariam novas doenças.


Testes foram realizados com formatos congelado e liofilizado da Sputnik V
Reuters


Duas versões foram aplicadas

Os testes foram efetuados com versões congeladas da vacina, uma vez que o Instituto Gamaleya está de olho na sua produção e distribuição em larga escala. As vacinas liofilizadas – ou seja, submetidas ao processo de liofilização, que consiste na desidratação e no congelamento a vácuo – também foram aplicadas, e viabilizam seu transporte para locais remotos mantendo-as estáveis em temperaturas baixas.

Para evitar que fossem previamente contaminados pela Covid-19, os participantes se isolaram assim que se voluntariaram a receber a Sputnik V, dirigindo-se em seguida a dois hospitais russos, onde permaneceram por 28 dias. Enquanto o formato congelado foi aplicado no Hospital Burdenko – uma agência do Ministério da Defesa –, exclusivamente por militares, a vacina liofilizada teve como público-alvo voluntários civis, sendo testada na Universidade Sechenov.

Alguns pacientes relataram efeitos colaterais ao receberem o imunizante, mas nenhum deles apresentou gravidade nos sintomas. Metade dos voluntários (50%) registrou temperatura alta, seguida de dor de cabeça (42%), falta de energia (28%) e dores nas juntas e nos músculos (24%), sintomas similares aos de outras vacinas do tipo.

Com o propósito de avaliar a eficácia da Sputnik V, os desenvolvedores da vacina tiveram que comparar o plasma dos voluntários inoculados com o de indivíduos infectados pelo novo coronavírus. Os estudiosos concluíram que a resposta dos anticorpos foi mais eficaz entre as amostras dos vacinados.

O estudo, conforme seus próprios autores, foi elaborado em pequena escala e incluiu apenas voluntários do sexo masculino, além de dispensar placebo ou vacina de controle. Ainda na acepção dos cientistas russos, embora haja pessoas com faixas etárias situadas entre 18 e 60 anos, a maioria dos participantes da pesquisa era jovem.

Além disso, eles também frisam a importância de realizar novos testes com amplos espectros de indivíduos, inclusive aqueles pertencentes a grupos de risco. Em entrevista à BBC, o pesquisador Alexander Gintsburg, do Gamaleya, afirmou que a terceira fase – a final e mais importante do projeto científico – já foi aprovada em 26 de agosto último e envolverá um contingente formado por 40 mil voluntários de diferentes idades e estados de saúde.


Pelo menos 20 países, entre eles o Brasil, já manifestam interesse na vacina
Reuters


Vacina gera polêmica

De acordo com informações da BBC News Brasil, a Sputnik V – que está entre as 165 vacinas em todo o globo que estão sendo desenvolvidas contra a Covid-19 – vem despertando polêmicas internacionais devido à agilidade na sua elaboração, entre outros fatores. No entanto, pelo menos 20 países, incluindo o Brasil, já estão interessados na compra da vacina russa.

Ainda segundo a agência de notícias, “ao mesmo tempo vozes da comunidade científica veem com ceticismo o fármaco russo, já que as pesquisas foram conduzidas de forma muito acelerada, e sem passar por todos os estágios normais”.

No próprio país de origem da vacina – cujo nome homenageia o primeiro satélite artificial a orbitar ao redor da Terra, concebido pela então União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS) durante o período da Guerra Fria –, seus cidadãos já começarão a ser imunizados em outubro.

Aqui no Brasil, o governador do Paraná, Ratinho Júnior (PSD), assinou em agosto um memorando de cooperação com a Rússia para fabricar a Sputnik V no estado, por intermédio do Instituto Tecnológico do Paraná (Tecpar).

O convênio prevê ainda a realização de testes no País, que dependem de liberação prévia da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), antes de uma eventual distribuição da vacina. A tendência é que o produto russo esteja disponível no território brasileiro a partir do segundo semestre de 2021.

Comentários