Contra o abuso do direito à liberdade nas redes sociais

Hugo Gonçalves – Jornalista (SRTE/BA 4507)

Atualizado às 19h20


Em razão do abuso de liberdade, crimes contra a honra se manifestam nas redes, geralmente praticados sob anonimato
Fotomontagem: Divulgação


Um dos direitos fundamentais exercidos em âmbito universal, a liberdade de expressão proporciona aos cidadãos a faculdade individual de pensamento e opinião em quaisquer meios, sem interferências de terceiros e vedado o anonimato. No entanto, se tal liberdade exceder os limites legalmente determinados, esse fenômeno se configura como abuso de direito, acarretando consequências danosas inclusive no ambiente digital. É em razão disso que os crimes contra a honra se manifestam nas redes sociais, geralmente praticados sob identidade anônima.

Nas sociedades contemporâneas, todo ser humano detém o livre arbítrio para raciocinar, se expressar e opinar – o que é explícito na Declaração Universal dos Direitos Humanos e reiterado na atual Constituição da República Federativa do Brasil, alicerçada nos princípios democráticos, liberais e antiautoritários. Portanto, esses instrumentos nos asseguram a capacidade de produzir e disseminar informações e ideias plurais, individual ou coletivamente, mediante diversos veículos de comunicação impressos ou eletrônicos, sem distinção de fronteiras de qualquer natureza – geográfica, econômica, social, política, ideológica, cultural, profissional, entre outras.

Embora a liberdade de expressão seja um dos fatores basilares para a edificação e consolidação da genuína democracia em escala mundial, seu excesso fora dos limites determinados pelos mecanismos jurídicos hoje vigentes é caracterizado como abuso, prejudicando a liberdade sob uma perspectiva aplicável à totalidade dos cidadãos. Essa conduta exorbitante, desempenhada por alguns indivíduos inconscientes e sem o mínimo conhecimento inerente à ética e à legislação, compromete o pleno exercício democrático, o que os leva à ausência de responsabilidade.

O mesmo ocorre sistematicamente na internet, sobretudo em sites e plataformas de mídias sociais, tornando-os ambientes suscetíveis à incidência recorrente de cibercrimes. Conteúdos que vêm se propagando em uma velocidade jamais observada em temporalidades pretéritas, a exemplo das fake news – notícias falsas, que induzem seus receptores à súbita desinformação –, de mensagens que reproduzem discursos de ódio e incitam o racismo, o sexismo, a homofobia e demais atos contra contingentes sociais minoritários, são evidências de como a livre manifestação do pensamento vem ultrapassando as margens estabelecidas pelas leis.

Tais conteúdos ilícitos, que em geral apresentam caráter ofensivo e discriminatório, são publicados nas mídias sociais majoritariamente sob anonimato – um dos atributos inibidores do efetivo desenvolvimento de uma sociedade em rede –, ocultando a autêntica identidade da pessoa física responsável por essas postagens na arena digital. Além disso, sua disseminação contínua e massiva promove prejuízos incomensuráveis ao legítimo exercício da liberdade de expressão – e também de imprensa, uma vez que ambos os direitos atuam concomitantemente.

Como exemplo de prática cibernética convertida em abuso de direito está o recente caso de Daniel Silveira, preso por ordem do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), por incitar condutas antidemocráticas e, portanto, anticonstitucionais. O motivo da prisão do deputado fluminense – aliado convicto do presidente Jair Bolsonaro – foi a divulgação, em suas redes, de um vídeo no qual ele preconizou abertamente o retorno do Ato Institucional nº 5, uma das mais repressivas ferramentas da ditadura militar que perpetuou durante duas décadas em nosso País, bem como agressões e ataques frequentes aos membros do Supremo.

Objetivando prevenir e erradicar certos tipos de comportamento abusivo na esfera digital, tal como aconteceu com Silveira, é essencial que o Judiciário exerça de imediato seu papel precípuo, julgando os responsáveis por tais condutas ilícitas para ordenar que eles sejam punidos, e que os conteúdos contrários ao verdadeiro direito à liberdade de expressão e opinião estejam indisponíveis na internet. Se respeitar os limites em consonância com os postulados legais e, primordialmente, das Constituições de cada nação, a justiça e a democracia haverão de prevalecer nas sociedades hodiernas.

P. S.: Este jornalista agradece especialmente à advogada Marcela Dalcon de Freitas (OAB/BA 34.221) – professora de Direito Digital do MBA em Marketing Digital e Mídias Sociais do Centro Universitário Jorge Amado (Unijorge), de Salvador, que o orientou na elaboração deste artigo, como requisito para a obtenção do seu excelente resultado na disciplina – por ter lhe autorizado a publicação inédita do conteúdo aqui no blog.

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