Índios Wai Wai produzem castanhas na Amazônia ajudando a mantê-la em pé
Ao manejarem de forma sustentável os frutos da castanheira, que servem de alimento e fonte de renda, nativos contribuem para conservação da floresta
Com informações da matéria exibida no programa Repórter Eco (TV Cultura) e do portal do selo Origens Brasil®
Matéria atualizada às 19h10; título atualizado em 5 de fevereiro de 2021, às 19h36
Aldeados no sudeste de Roraima, os índios da etnia Wai Wai são responsáveis pela produção sustentável da castanha-do-brasil ou castanha-do-pará (Bertholletia excelsa). Com a finalidade de manejar os frutos oriundos dessa gigante árvore, nativa da Amazônia, eles constroem abrigos temporários em plena mata exuberante e transportam pelos rios as castanhas já ensacadas, contribuindo para a preservação da maior floresta tropical do mundo.
Deslocando-se das suas terras, os indígenas descem os rios através de canoas, que realizam o transporte das sacas pesadas de castanhas. Coletados entre os meses de maio e agosto, os frutos da castanheira – espécie ameaçada de extinção, considerada a rainha da Floresta Amazônica, onde são abundantes – servem tanto de alimento essencial para as comunidades locais quanto de fonte de renda para elas.
“Eles (os índios Wai Wai) se deslocam nas aldeias, que são as moradias constantes, e fazem essas espécies de moradias temporárias dentro dessas regiões onde têm muitas castanheiras”, disse o fotógrafo e cineasta Fábio Nascimento, que documentou o manejo das castanhas, em depoimento ao programa Repórter Eco, da TV Cultura.
Fábio relatou ainda que os Wai Wai permanecem por alguns meses coletando os frutos e esperando a cheia do rio. Em seguida, os nativos os transportam rio abaixo visando à sua comercialização, bem como à sua posterior transformação em alimento, entre outras utilidades. “Quanto a esse conhecimento e essa compreensão da complexidade da floresta, e conciliar isso com o modo de produção, eu achei algo fantástico, excepcional”, comentou.
O trabalho de manejo das castanhas se constitui de quatro passos. Primeiro, os índios mantêm a castanheira limpa de cipós. Segundo, eles quebram os frutos – também chamados de ouriços – com o chão protegido para evitar a sua contaminação. Já o terceiro passo consiste na lavagem das castanhas, separando as boas das ruins. O quarto e último é a secagem dos frutos já selecionados.
“Nós sabemos que a gente fez capacitação, através do Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas). Então todos os extrativistas sabem fazer isso, selecionando, secando castanhas, lavando. A gente vende, aqui no sul do estado (de Roraima), castanha selecionada. Então preservamos a floresta para não derrubar para produzir mais. Isso é importante a castanha estar na Amazônia”, explicou Fernandinho Wai Wai, liderança indígena da região.
Segundo Fábio Nascimento,
a maneira como os indígenas produzem e consomem seus alimentos determina a sua
relação harmoniosa com o planeta. Portanto, essas populações sempre estiveram
presentes no ambiente produzindo-os há milhares de anos. “Então, existem muitas
soluções para continuarmos fazendo isso, porém que nós o façamos de maneira que
isso dure por gerações e gerações”, salientou o fotógrafo e cineasta.
Prontas para vender
As castanhas produzidas pelos Wai Wai são comercializadas por intermédio de uma rede que promove negócios sustentáveis na Amazônia, que tem por objetivo valorizar áreas prioritárias para a conservação da floresta. Denominada Origens Brasil®, a cadeia administrada pelo Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora), uma organização não governamental (ONG) ambientalista, mantém o selo de mesmo nome.
As atividades do Origens Brasil® tiveram início há cinco anos, envolvendo as populações indígenas, quilombolas e ribeirinhas da região. Atualmente, cerca de 1.800 produtores atuantes em quatro estados – Amapá, Amazonas, Pará e Roraima – oferecem mais de 40 produtos. Essas matérias-primas são vendidas para 28 empresas brasileiras e também estadunidenses que participam da iniciativa.
Para o coordenador de mercado do selo, Luiz Brasi Filho, ao observar o mapa do desmatamento no Brasil, verifica-se que o fenômeno segue avançando na Amazônia. Porém, existem certas áreas onde a floresta se encontra extremamente conservada, que são as terras indígenas e as unidades de conservação.
“É importante sabermos que esses povos são os verdadeiros guardiões da nossa floresta; são eles que coletam os produtos, mantendo a floresta em pé”, frisou o executivo, em entrevista ao Repórter Eco.
A partir dessa produção sustentável,
o Origens Brasil® conecta os produtos com as empresas primando pelo comércio ético,
que no âmbito da rede possui alguns critérios. Entre eles, Brasi Filho destacou
as relações das empresas com as comunidades participantes, a transparência e o
equilíbrio de forças que envolvem essas negociações, o cálculo dos preços dos
insumos e a prática do preço justo.
Selo vem para melhorar vida das populações
Historicamente, as populações tradicionais brasileiras, incluindo os povos indígenas, vendiam ou continuam vendendo suas matérias-primas a preços menores, sem uma remuneração que lhes garanta melhores condições para viver. Mas, de acordo com Luiz Brasi Filho, o Origens Brasil® vem justamente visando a contrapor esse antigo paradigma.
“Trazemos o setor empresarial para negociação diretamente com esses povos na floresta, para que a gente consiga cortar intermediários e que as empresas valorizem o ingrediente, pagando um preço justo e remunerando cada vez melhor as pessoas”, afirmou.
Para convencer as pessoas com poder aquisitivo a conferir o selo Origens Brasil® e, eventualmente, consumir os alimentos que o possuem, ele pontuou alguns aspectos essenciais. Nessa perspectiva, o consumidor precisa verificar se esses produtos passaram por algum tipo de mão de obra degradante durante a sua produção, a exemplo do trabalho infantil, e também por ações vinculadas ao desmatamento.
“O setor empresarial
muitas vezes vai pagar um pouco mais no produto, mas que traz essa garantia. E
eu, como consumidor, gosto de valorizar as empresas que constroem essas
práticas. Estamos falando de negócios e respeito às pessoas e ao bem viver no
nosso mundo, que é um só”, concluiu Brasi Filho.
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