Tatuagem, preconceitos e identidade de gênero
Artigo escrito em 3 de dezembro de 2012 para
o blog Minha Tattoo Bahia
Pelo fato de
a tatuagem ser consequência da estrutura de funcionamento de grupos
marginalizados em termos de controle, corporalidade e identidade, a noção de
preconceito contra ela ou os tatuados se insere como um discurso que faz
encobrir sua estrutura. A junção da arte corporal com a marginalidade, por
exemplo, disfarça a resistência de alguns indivíduos ao controle sobre seus
corpos. Isso associa a ideia de tatuagem como representação do exotismo
selvagem e da marginalidade.
Inúmeras formas de
preconceito contra os tatuados ou a tatuagem se manifestam ainda no mercado de
trabalho. Dentro da profissão, os tatuadores são discriminados, sobretudo nas
relações de gênero, por ser uma atividade basicamente masculina. Já em ambientes
laborais, geralmente hostis à tatuagem, os tatuados são alvos de represálias e
restrições. Como solução para não serem vítimas de preconceito, eles optam por
áreas corporais menos expostas ao olhar, porém nem sempre a tatuagem está
completamente escondida.
O medo do
preconceito e das retaliações no mundo profissional existe, inserindo-se no
imaginário da tatuagem na nossa sociedade. A associação entre marginalidade e
tatuagem, penetrada no senso comum, parece alimentar o medo relacionado ao
mercado de trabalho.
Grupos
marginalizados, isolados ou excluídos podem significar que a tatuagem traduz a
situação vivenciada por seus integrantes. Logo, ela apresenta, para esses
grupos, uma forma de incorporação. O isolamento de determinados grupos tatuados
também implica determinadas experiências físicas e psicológicas.
Segundo David Le
Breton, o corpo é um objeto de transição que pode ser manipulado e transformado
conforme os desejos do indivíduo. Ele ainda pondera que, por ser situada em um
contexto contraditório entre adolescentes e seus pais, a tatuagem serve para
tomar posse de si.
Ao analisarem as
tatuagens nas academias de musculação, os pesquisadores César Sabino e Madel
Luz classificaram os tipos de desenhos em cada um dos três gêneros: feminino,
masculino e unissex. As mulheres tatuam com frequência determinadas figuras,
como flores, estrelas, borboletas, lua, sol, personagens femininas de histórias
em quadrinhos, beija-flores, gatos e fadas.
Já os homens
carregam em seus corpos reproduções pictóricas de águias, cruzes, panteras,
tigres, dragões, demônios, caveiras, armas, arame farpado, sereias, mulheres
nuas, tubarões, esqueletos com foice e capuz e, principalmente, cães da raça pitbull.
Tanto homens quanto mulheres tatuam ideogramas, desenhos tribais, palavras e
frases em letras góticas, símbolos da computação, códigos de barra, corações e
figuras mitológicas.
Quanto à
identidade de gênero, a tatuagem distingue o homem da mulher por seus atributos
psicológicos e emocionais. A tatuagem de um animal selvagem no braço de um
homem dá a ele aspectos masculinos, como força, destruição, descontrole,
agressividade e violência; enquanto tatuar na pele de uma mulher borboletas,
flores, estrelas e animais domésticos ou inofensivos (gatos, beija-flores,
etc.), entre outras figuras, confere-lhe qualidades femininas, como delicadeza,
inocência, sensibilidade, charme, beleza e sedução.
A tatuagem traz para o
indivíduo a expressão particular e intransferível de suas sensações e da
constituição de identidades absolutamente singulares, que também difundem o
elogio da diferenciação pessoal em meio a um contexto dominado por uma lógica
indiferenciada e impessoal. Além de servir de “arena gráfica” para os indivíduos
que nele se tatuam, o corpo se transforma em um ambiente favorável de um
processo de diferenciação e individualização.
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