26 de Setembro reverencia vitórias da comunidade surda
Efeméride anual, que neste ano é celebrada hoje, o Dia Nacional dos Surdos simboliza as lutas e os avanços dos deficientes auditivos brasileiros por condições de vida dignas, mesmo convivendo com o silêncio da invisibilidade
Pessoas surdas comemoram seu dia para defender oportunidades de inserção social
(Foto: Hugo Gonçalves – 02/07/2014)
A efeméride representativa foi instituída pela Lei nº 1.796, sancionada em 29 de outubro de 2008 pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), em alusão à criação, em 26 de setembro de 1857, da primeira escola brasileira voltada especificamente para a comunidade surda, o Instituto Imperial para Surdos-Mudos – hoje Instituto Nacional de Educação de Surdos (Ines) –, sediado na cidade do Rio de Janeiro.
Linguagem de sinais adotada pelos surdos brasileiros possui estrutura gramatical própria
(Foto: Hugo Gonçalves – 27/11/2013)
Pessoas surdas comemoram seu dia para defender oportunidades de inserção social
(Foto: Hugo Gonçalves – 02/07/2014)
Apesar de vivenciarem o preconceituoso silêncio da invisibilidade, a comunidade surda do Brasil irradia sua voz por meio da luta por uma qualidade de vida decente com mais educação, saúde, lazer e trabalho, entre outros fatores, garantindo oportunidades de inserção social com cidadania e dignidade. Em função disso, em 26 de setembro, portadores de deficiência auditiva de todo o país celebram anualmente o Dia Nacional dos Surdos.
A efeméride representativa foi instituída pela Lei nº 1.796, sancionada em 29 de outubro de 2008 pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), em alusão à criação, em 26 de setembro de 1857, da primeira escola brasileira voltada especificamente para a comunidade surda, o Instituto Imperial para Surdos-Mudos – hoje Instituto Nacional de Educação de Surdos (Ines) –, sediado na cidade do Rio de Janeiro.
Fundado pelo professor surdo francês Hernest Huet, um usuário do método combinado entre a língua de sinais e a língua oral que aportou no Brasil a convite e sob o patrocínio do imperador D. Pedro II, o instituto funcionava originariamente como asilo, onde eram atendidos apenas surdos do sexo masculino. Nesse universo de deficientes auditivos, provenientes de todas as regiões do país, muitos deles tinham suas respectivas famílias abandonadas.
Passados cento e cinquenta e sete anos, o atual Ines, ainda situado no Rio (funciona no bairro das Laranjeiras, na zona sul), tornou-se referência nacional na área da surdez. O órgão federal atende, em seu Colégio de Aplicação, crianças, jovens e adultos surdos, pertencentes a ambos os sexos, além de oferecer ensino superior através do curso bilíngue de graduação em Pedagogia, experiência pioneira na América Latina.
“Em razão de ser a única instituição de educação de surdos em território brasileiro e mesmo em países vizinhos, por muito tempo o Ines recebeu alunos de todo o Brasil e do exterior, configurando-se numa instituição de referência para os assuntos de educação, profissionalização e socialização de surdos”, escreveu a diretora geral, Solange Maria da Rocha, no portal do instituto (portalines.ines.gov.br).
Instituída por lei em 2008, a data faz alusão à fundação da primeira escola para surdos no país, o Ines, no Rio
(Foto: Divulgação)
Do oralismo à língua de sinais
Inúmeros avanços balizaram e intensificaram as lutas pelos direitos dos surdos e pelo combate às discriminações contra essa importante minoria linguística. Nesse panorama evolutivo, destacam-se métodos comunicacionais e pedagógicos que adquiriram potencial a partir do século XX, quando, graças ao progresso científico e tecnológico, a instrução dos surdos passou a ser nitidamente dominada pelo oralismo.
Defendido com eloquência pelo cientista escocês radicado nos Estados Unidos Alexander Graham Bell (1847-1922) durante o Congresso Internacional de Educação de Surdos, organizado em Milão, na Itália, entre os dias 9 e 12 de setembro de 1880, o oralismo consiste na utilização da língua oral como ferramenta eficaz para ensinar as pessoas com deficiência auditiva, tornando-as oralizadas.
“No entanto, sem a efetiva cura da surdez, os insucessos do oralismo começaram a ser evidenciados, uma vez que os surdos educados nesse método tinham dificuldades de conseguir um emprego, comunicar-se com ouvintes desconhecidos ou manter uma conversa fluída”, afirmou a assessoria de imprensa da Fundação Catarinense de Educação Especial (FCEE).
Na década de 1970, uma professora da Gallaudet University, em Washington, capital dos EUA – única universidade exclusiva para surdos no mundo –, veio ao Brasil para fomentar as discussões concernentes ao bilinguismo no país. Esse fato viabilizou, a partir do decênio seguinte, o interesse, pelos linguistas brasileiros, em estudar e difundir a língua brasileira de sinais (Libras), bem como apoiar mecanismos de desenvolvimento educacional do surdo.
Em 1986, por iniciativa da direção do Ines, concebeu-se um projeto de pesquisa batizado de Projeto de Alternativas Educacionais (PAE), cujo propósito essencial era aplicar a filosofia da Comunicação Total, preconizada pelos estadunidenses da Gallaudet University, às turmas de alunos matriculados no instituto à época.
“No entanto, sem a efetiva cura da surdez, os insucessos do oralismo começaram a ser evidenciados, uma vez que os surdos educados nesse método tinham dificuldades de conseguir um emprego, comunicar-se com ouvintes desconhecidos ou manter uma conversa fluída”, afirmou a assessoria de imprensa da Fundação Catarinense de Educação Especial (FCEE).
Na década de 1970, uma professora da Gallaudet University, em Washington, capital dos EUA – única universidade exclusiva para surdos no mundo –, veio ao Brasil para fomentar as discussões concernentes ao bilinguismo no país. Esse fato viabilizou, a partir do decênio seguinte, o interesse, pelos linguistas brasileiros, em estudar e difundir a língua brasileira de sinais (Libras), bem como apoiar mecanismos de desenvolvimento educacional do surdo.
Em 1986, por iniciativa da direção do Ines, concebeu-se um projeto de pesquisa batizado de Projeto de Alternativas Educacionais (PAE), cujo propósito essencial era aplicar a filosofia da Comunicação Total, preconizada pelos estadunidenses da Gallaudet University, às turmas de alunos matriculados no instituto à época.
Linguagem de sinais adotada pelos surdos brasileiros possui estrutura gramatical própria
(Foto: Hugo Gonçalves – 27/11/2013)
Libras é reconhecida por lei
A fonoaudióloga pernambucana Genivalda Barbosa, no entanto, admite, em seu artigo intitulado Histórico da educação de surdos no Brasil, que “esta perspectiva não tomou corpo”, salientando uma conquista de relevância histórica para a comunidade surda. Trata-se da sanção, em 24 de abril de 2002, da Lei nº 10.436, que reconheceu a Libras como dispositivo legal de comunicação e expressão.
Ratificado pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), o texto da lei conceitua a metodologia linguística como “forma de comunicação e expressão, em que o sistema linguístico de natureza visual-motora, com estrutura gramatical própria, constituem um sistema linguístico de transmissão de ideias e fatos, oriundos de comunidades de pessoas surdas do Brasil”.
A legislação ainda garante, por parte tanto do Estado quanto das empresas privadas, o incentivo ao uso e à difusão da linguagem de sinais como parâmetro de comunicação objetiva e de utilização corrente das comunidades surdas no país. Como estratégia de evidenciar o caráter bilíngue da comunicação entre os surdos, a Libras não pode substituir a língua portuguesa em sua modalidade escrita.
Ensino de Libras obrigatório
Também em conformidade com a Lei nº 10.436, a União, os estados, os municípios e o Distrito Federal devem assegurar a inclusão do ensino de Libras nos cursos de Educação Especial, Fonoaudiologia e Magistério, em seus níveis médio e superior, como parte integrante dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN). No âmbito da saúde, as instituições públicas e as empresas concessionárias desse tipo de serviço público devem prestar aos surdos atendimento e tratamento sanitário adequado.
No que tange ao sistema de educação inclusiva para crianças portadoras de necessidades especiais, as secretarias estaduais e municipais de Educação passaram a coordená-lo, favorecendo o surgimento, para surdos, das salas de recursos e classes especiais, além de algumas escolas especiais.
O Ministério da Educação (MEC), visando orientar o ensino de deficientes auditivos no território nacional, implantou em 2002 o Programa Nacional de Educação de Surdos, com abordagem bilíngue. Para que a iniciativa se efetivasse, o MEC deliberou a instalação, em cada uma das 27 unidades federativas, de um Centro de Capacitação de Profissionais da Educação e de Atendimento às Pessoas com Surdez (CAS), a fim de socializar informações pertinentes à educação de surdos e execução de cursos propostos.
É por estar associado às vitórias da comunidade surda brasileira em contextos díspares de sua trajetória que o 26 de Setembro vem se consolidando a cada ano, não somente numa data magna para uma parcela minoritária que, embora marginalizada, continua superando seus obstáculos e reivindica com perseverança a igualdade de direitos. Mas, sobretudo, numa reverência óbvia à inclusão dos surdos na sociedade.
A fonoaudióloga pernambucana Genivalda Barbosa, no entanto, admite, em seu artigo intitulado Histórico da educação de surdos no Brasil, que “esta perspectiva não tomou corpo”, salientando uma conquista de relevância histórica para a comunidade surda. Trata-se da sanção, em 24 de abril de 2002, da Lei nº 10.436, que reconheceu a Libras como dispositivo legal de comunicação e expressão.
Ratificado pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), o texto da lei conceitua a metodologia linguística como “forma de comunicação e expressão, em que o sistema linguístico de natureza visual-motora, com estrutura gramatical própria, constituem um sistema linguístico de transmissão de ideias e fatos, oriundos de comunidades de pessoas surdas do Brasil”.
A legislação ainda garante, por parte tanto do Estado quanto das empresas privadas, o incentivo ao uso e à difusão da linguagem de sinais como parâmetro de comunicação objetiva e de utilização corrente das comunidades surdas no país. Como estratégia de evidenciar o caráter bilíngue da comunicação entre os surdos, a Libras não pode substituir a língua portuguesa em sua modalidade escrita.
Ensino de Libras obrigatório
Também em conformidade com a Lei nº 10.436, a União, os estados, os municípios e o Distrito Federal devem assegurar a inclusão do ensino de Libras nos cursos de Educação Especial, Fonoaudiologia e Magistério, em seus níveis médio e superior, como parte integrante dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN). No âmbito da saúde, as instituições públicas e as empresas concessionárias desse tipo de serviço público devem prestar aos surdos atendimento e tratamento sanitário adequado.
No que tange ao sistema de educação inclusiva para crianças portadoras de necessidades especiais, as secretarias estaduais e municipais de Educação passaram a coordená-lo, favorecendo o surgimento, para surdos, das salas de recursos e classes especiais, além de algumas escolas especiais.
O Ministério da Educação (MEC), visando orientar o ensino de deficientes auditivos no território nacional, implantou em 2002 o Programa Nacional de Educação de Surdos, com abordagem bilíngue. Para que a iniciativa se efetivasse, o MEC deliberou a instalação, em cada uma das 27 unidades federativas, de um Centro de Capacitação de Profissionais da Educação e de Atendimento às Pessoas com Surdez (CAS), a fim de socializar informações pertinentes à educação de surdos e execução de cursos propostos.
É por estar associado às vitórias da comunidade surda brasileira em contextos díspares de sua trajetória que o 26 de Setembro vem se consolidando a cada ano, não somente numa data magna para uma parcela minoritária que, embora marginalizada, continua superando seus obstáculos e reivindica com perseverança a igualdade de direitos. Mas, sobretudo, numa reverência óbvia à inclusão dos surdos na sociedade.
Acima, o professor Milton Bezerra Filho, expoente dos surdos na Bahia
Devido às conquistas da comunidade surda, o 26 de Setembro vem se consolidando todos os anos
(Foto: Hugo Gonçalves – 07/09/2014)
Confira, abaixo, a íntegra da lei que instituiu, no Brasil, o Dia Nacional dos Surdos
Lei nº 11.796, de 29 de outubro de 2008
Institui o Dia Nacional dos Surdos.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1º Fica instituído o dia 26 de setembro de cada ano como o Dia Nacional dos Surdos.
Art. 2º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 29 de outubro de 2008; 187º da Independência e 120º da República.
LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
Fernando Haddad
João Luiz Silva Ferreira
Dilma Rousseff
Comentários
Gostei muito da reportagem.
Um abraço.
Luzana Pedreira