Atriz famosa declarou apoio a Collor

Cláudia Raia, já conhecida do grande público, manifestou seu voto a então presidenciável no pleito de 1989, ao lado de outros pouquíssimos artistas que lhe deram suporte

A atriz Cláudia Raia, uma das mais consagradas da criativa teledramaturgia brasileira, esteve entre as ínfimas figuras do ramo artístico a declarar com veemência seu apoio à candidatura de Fernando Collor de Mello (PRN) à Presidência da República em fins de 1989, após um intervalo de 29 anos sem eleger o mandatário supremo da nação. Então com 22 anos de idade, Cláudia já era experiente, possuindo em seu currículo quatro peças teatrais, quatro telenovelas da Rede Globo (claro), dois filmes e dois programas humorísticos globais.

Outros astros que manifestaram solidariedade a Collor, além de Cláudia, foram, conforme Conti (1999, p. 228), as atrizes Marília Pêra, Ísis de Oliveira – irmã da ex-modelo e também atriz Luma de Oliveira –, Pepita Rodrigues – viúva do saudoso ator Carlos Eduardo Dolabella (1937-2003) – e Tereza Rachel, todas globais, a cantora Simone e o cineasta Ipojuca Pontes, marido de Tereza, que em 1990 seria nomeado por Collor para exercer a titularidade da Secretaria de Cultura, pasta estabelecida pelo novo governo em substituição ao ministério. E, obviamente, o ostensivo amparo das Organizações Globo.

Durante sua passagem como governador de Alagoas, entre março de 1987 e maio de 1989, Fernando Collor se autointitulou “caçador de marajás”, pois prometia exterminar as prerrogativas da parcela mais enriquecida do funcionalismo público daquele estado do Nordeste, as populares mordomias. Collor transplantou esse receituário em âmbito nacional na campanha que o ascendeu ao Planalto no segundo turno das eleições, disputado acirradamente em 17 de dezembro de 1989, corpo a corpo, com o então deputado federal Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Profissão: "repórter" collorida

Segue, abaixo, um fragmento extraído do horário eleitoral gratuito de televisão do então candidato Collor. O material publicitário audiovisual anexado nesta matéria refere-se a uma entrevista, concedida à “repórter” Cláudia Raia, com o carpinteiro Dermeval Gomes da Silva, proveniente de uma localidade periférica nordestina.

Na entrevista, Dermeval confessou à atriz que o ex-governador alagoano – hoje senador pelo PTB e vice-presidente da legenda – seria o presidenciável ideal para retomar as rédeas do Brasil, estagnadas desde a crise produzida pelas tentativas sucessivas e malsucedidas de controle inflacionário estabelecidas pelo então presidente José Sarney, a saber: o Plano Cruzado (1986), o Plano Cruzado II (1986), o Plano Bresser (1987) e o Plano Verão (1989).

O entrevistado, com seu carregado sotaque nordestino, também alfinetou Lula e seu partido, dizendo que eles só vivem das greves operárias organizadas pelos sindicatos, encabeçados pela Central Única dos Trabalhadores (CUT), braço sindical do PT. Reparem, no trecho a seguir, com 2 minutos e 20 segundos de duração, Cláudia Raia reproduzindo a retórica collorida, traduzida na expressão “minha gente”, pronunciada duas vezes pela atriz global e também dançarina.



Transcrição da entrevista

Cena 1 – Quintal da casa de Dermeval

Cláudia Raia – Olá, bom dia?

Dermeval Gomes da Silva – Bom dia.

C. R. – Tudo bem?

D. G. S. – Tudo bem.

C. R. – Eu queria fazer uma pergunta para o senhor. O senhor votou em quem no primeiro turno?

D. G. S. – (Em) Fernando Collor de Mello.

C. R. – E agora, no segundo turno, no dia 17 de dezembro, o senhor vai votar...

D. G. S. – No Fernando Collor de Mello.

C. R. – Muito bem. É isso aí, minha gente. É assim que ele fala, não é? Bom, eu acho que vocês já me conhecem. Eu sou a Cláudia Raia, e também votei no Fernando Collor de Mello.

Cena 2 – Cozinha da casa de Dermeval

C. R. – Certamente, vocês não conhecem o senhor Dermeval Gomes da Silva. Ele é carpinteiro, é casado, tem quatro filhos. “Seu” Dermeval, por que que o senhor votou no Fernando Collor de Mello?

D. G. S. – Eu votei no Fernando Collor de Mello porque eu acho que ele é o único ideal para ser o presidente da República.

C. R. – E por que que o senhor acha isso?

D. G. S. – Bom, ele é um homem que fala a verdade, não é um homem que fica mentindo, certo? Falando dos outros e depois do outro está pegando a mão do outro, igual ao que (Leonel) Brizola (1922-2004, candidato do PDT que, derrotado no primeiro turno em 1989, apoiou Lula no segundo) está fazendo isto, certo? Então eu acho que ele não é o ideal de ser o presidente da República.

C. R. – E o senhor acha que ele vai ser um bom presidente para as pessoas que têm os mesmos problemas que o senhor?

D. G. S. – Eu acho. Eu acho que todos nós estamos esperando isso. Eu acho que ele vai resolver esse problema da dificuldade que está existindo no Brasil.

C. R. – Existe um candidato do PT (Lula) que se diz o candidato dos pobres. O que o senhor acha disso?

D. G. S. – Bom, eu não acho que esse candidato do PT seja o candidato dos pobres, porque o Partido do Trabalhador (sic), certo, ele só é casado de greve. E greve não traz barriga cheia para ninguém.

Cena 3 – Cláudia junto a populares anônimos

C. R. – Minha gente, essas pessoas que estão aqui, esse senhor que nós acabamos de conversar, não são empresários ricos não. São pessoas do povo, gente que passa muita necessidade, e que vão votar em Fernando Collor de Mello. O povo não é bobo, não.

P. S.: O vídeo apresentado nesta matéria foi postado originalmente pelo jornalista Ricardo Noblat, do jornal carioca O Globo, em seu canal no Youtube.

Referências

CONTI, Mário Sérgio. Notícias do Planalto: a imprensa e Fernando Collor. São Paulo: Companhia das Letras, 1999.

HORÁRIO Eleitoral Gratuito de Televisão. Dez. 1989. In: CLÁUDIA Raia, a repórter de Collor. Vídeo postado por Ricardo Noblat no Youtube em 26 out. 2010. Disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=hscP0Otqh4o&feature=player_embedded. Acesso em: 16 out. 2011.

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