Planejando a mobilidade

Sessão especial no plenário da Assembleia debateu metas para o sistema de transporte urbano de Salvador até a Copa de 2014

Metrô, mobilidade urbana, Copa do Mundo de 2014 e inclusão social. Esses quatro tópicos articulados e inter-relacionados com a finalidade de projetar expectativas para o futuro de Salvador e solucionar a questão do transporte na cidade foram focados em sessão especial na tarde da última quinta-feira (5), no plenário da Assembleia Legislativa, no Centro Administrativo da Bahia (Cab). O autor da proposta foi o terceiro-secretário da Casa, deputado estadual Álvaro Gomes (PC do B).

A sessão plenária, declarada aberta pelo presidente da Assembleia, deputado Marcelo Nilo (PDT), congregou segmentos diversificados. Participaram autoridades políticas, dirigentes de entidades representativas e de sindicatos, engenheiros, metroviários, membros da União da Juventude Socialista (UJS) no estado e populares em geral, pondo em evidência o próspero debate democrático acerca da implementação do metrô e de projetos de mobilidade urbana na capital baiana e em municípios contíguos.

Segundo seu proponente Álvaro Gomes, primeiro orador, a sessão especial foi um dos momentos oportunos que estão contribuindo no equacionamento da questão dos meios de locomoção soteropolitanos. “O grande gargalo de Salvador é a mobilidade urbana. O problema é que estamos tirando o sono, a tranquilidade, a paciência”, destacou o parlamentar. Ele também enfatizou que o evento estabeleceu um vínculo direto entre o legado da próxima Copa, sediada no Brasil, e as benfeitorias sociais, um dos impactos positivos a serem gerados pelo mais importante torneio de futebol internacional.

Compuseram a mesa do evento, além de Álvaro, o secretário estadual para Assuntos da Copa do Mundo Fifa Brasil 2014, Ney Campello, o chefe de gabinete da Secretaria do Desenvolvimento Urbano (Sedur), Jessé Motta Filho, o promotor do Ministério Público, Cristiano Chaves, o superintendente da Superintendência de Desportos do Estado da Bahia (Sudesb), Raimundo Nonato Tavares, o Bobô, o presidente do Conselho Baiano de Turismo, Sílvio Pessoa, o presidente do Sindicato dos Engenheiros da Bahia (Senge), Ubiratan Félix, entre outros.

Rodízio reduz fluxo

Dentre as alternativas viáveis para o escoamento do tráfego urbano, de acordo com o deputado comunista, é o rodízio de carros, a fim de minimizar constantes congestionamentos. Álvaro citou duas pesquisas concernentes ao quantitativo de veículos na cidade. Segundo o Departamento de Infraestrutura de Transportes da Bahia (Derba), há cerca de 740 mil veículos circulando no perímetro urbano de Salvador; paradoxalmente, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) chegou à conclusão que ela possui 1 carro para cada 3 habitantes, um número insuficiente.

Também no levantamento do Ipea, Salvador é a única cidade isenta de metrô dentre as cinco metrópoles brasileiras pesquisadas pelo instituto. “Sou um dos grandes entusiastas para a implantação do metrô na primeira capital brasileira”, explicitou Álvaro Gomes. Para apurar as denúncias de irregularidades nas obras do metrô, a Assembleia realizou uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) específica, da qual o proponente da sessão foi presidente. Álvaro encerrou o discurso inaugural na tribuna com a esperança de que o novo sistema de mobilidade possa privilegiar as pessoas, e não o lucro.

O orador subsequente, deputado Capitão Tadeu (PSB), parabenizou o proponente e reiterou as alternativas que ele apontou para desafogar o trânsito na capital baiana. De acordo com o parlamentar socialista, o metrô continua sendo uma promessa, a despeito do incremento da frota veicular. “Os congestionamentos em Salvador nos aprisionam”, disse Tadeu, indignado. “Quem é a culpada? A Prefeitura de Salvador, por não oferecer um transporte público de qualidade”, questionou.

Capitão Tadeu preconiza um pacto social efetivo, visando aperfeiçoar a infraestrutura da terceira maior metrópole do país para e após a Copa de 2014. “A Copa do Mundo vai passar, mas a vida de todos nós continuará”, afirmou. Diretor-administrativo do Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia da Bahia (Crea-BA), Enéas de Almeida Filho discutiu a mobilidade nas cidades banhadas pela Baía de Todos-os-Santos e a construção da ponte interligando Salvador e a ilha de Itaparica. Para Enéas, a ponte é necessária, mas o estudo do local é um dos parâmetros relevantes para sua edificação.

Cooperação público-privada

Aspecto problemático cuja gravidade tem significativa dimensão, a questão da mobilidade urbana deve ser enfrentada pelo esforço cooperativo entre governo, sociedade civil e iniciativa privada. O gestor municipal da Copa, Leonel Leal Neto, ponderou a inviabilização de Salvador quanto ao seu crescimento horizontal e lembrou a situação do transporte antes da adoção de alguns melhoramentos. “Há uns seis ou sete anos, nós não tínhamos bilhetagem eletrônica, e o número de assaltos em coletivos era maior”, falou Leonel.

Segundo o gestor da Copa em Salvador, a resposta da prefeitura é suplantar a quantidade de meios de transporte e integrá-los sistematicamente, com metrô, ônibus, ciclovia, trem e duas modalidades alternativas de coletivos, ainda em discussão: o Veículo Leve sobre Trilhos (VLT) ou o Veículo Leve sobre Pneus (BRT). A prefeitura e o governo do estado, para Leonel, têm a legalidade e a legitimidade na contemplação da qualidade do transporte urbano.

O presidente da Federação Nacional dos Metroviários (Fenametro) e secretário-geral do Sindicato dos Metroviários de São Paulo, Wagner Fajardo, fez um comentário crítico e audaz sobre a situação dos metrôs brasileiros hoje vivenciada. Ele evidenciou que o Programa de Aceleração do Crescimento (Pac) da Copa, até agora, não investiu na expansão do sistema metroviário no país, fato muito lamentável.

Fajardo mencionou que o Brasil é o país com maior incipiência de transporte ferroviário no mundo. “O que tem assistido hoje é um enxame de BRT no Brasil inteiro”, criticou o sindicalista, em alusão ao BRT, opção de coletivo considerada ineficaz por alguns. A morosidade nas obras dos metrôs de Salvador e de Fortaleza está sendo regida por seu financiador, o Banco Mundial, que, para Fajardo, é uma “aberração”.

Grande parte dos metrôs brasileiros é privada, como os do Rio de Janeiro, do Recife e de Belo Horizonte, além da Linha 4-Amarela, de São Paulo, administrada por uma parceria público-privada (PPP). Fenômeno similar manifesta-se na capital da Bahia, onde o sistema metroviário será gerido pelo poder privado, através da Companhia de Transportes de Salvador (CTS).

O presidente do Sindicato dos Trabalhadores na Indústria da Construção e da Madeira no Estado da Bahia (Sintracom), José Ribeiro, ressaltou as mortes recentes de operários por acidentes de trabalho, um drama na categoria. Só na Rótula do Abacaxi, dois óbitos ocorreram durante a obra da Via Expressa Baía de Todos-os-Santos. “Discutir mobilidade urbana com inclusão social: essa é uma questão importante”, endossou o presidente do Crea-BA, Jonas Dantas. Conforme o dirigente, a mobilidade sempre contemplou os transtornos na fluidez do tráfego.

Entre o caos e a eficácia

“Lamentavelmente, Salvador se transformou numa mercadoria. Quem tem dinheiro, compra suas terras”, diz Dantas. Visto como um paradoxo ao caos, a cidade está implementando programas eficientes de locomoção. “Temos que fortalecer as bases sociais para que os projetos possam beneficiar a sociedade”, previu o presidente do Crea baiano. O conselheiro recordou que o plano do metrô de Salvador foi lançado em 1999, a princípio fracionado em quatro etapas. Hoje, suas obras, a cargo do consórcio Metrosal, estão sendo executadas unicamente no trecho compreendido entre o Acesso Norte e a estação de transbordo da Lapa.

Cumprir o objetivo de preparar Salvador para ser uma das cidades-sedes da próxima Copa é tarefa primordial da Secretaria para Assuntos da Copa do Mundo Fifa Brasil 2014 (Secopa). Seu titular, Ney Campello, justificou a concentração da lógica de planejamento urbano no grande capital, sobretudo no ramo imobiliário, em detrimento do cidadão soteropolitano. Campello espera que as diretrizes para a organização do campeonato mundial de futebol prevaleçam nas decisões democráticas. “A agenda da Copa é uma agenda sinérgica, uma agenda de convergência e de interesses”, pontuou.

Do ponto de vista do meio ambiente, automóveis e ônibus convencionais liberam agentes poluentes. Foi o que declarou o presidente do Grupo Ambientalista da Bahia (Gambá), Renato Cunha, último orador da sessão especial. Na tribuna do plenário, Cunha defendeu a ampliação do Aeroporto Internacional Deputado Luís Eduardo Magalhães, a preservação dos parques de Pituaçu e de São Bartolomeu e da lagoa do Abaeté e a criação de áreas de proteção ambiental, promovendo a sustentabilidade.

O deputado Álvaro Gomes, ao pronunciar as considerações finais da sessão, salientou a extensa produtividade nos debates. Afirmou que a Assembleia Legislativa está engajada para discutir profundamente o tema da mobilidade urbana em Salvador, objetivando o planejamento para os mais necessitados. “Nós temos que pensar cada vez mais numa cidade mais humana, com necessidade de inclusão social”, prometeu Álvaro.

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