Apocalipse nordestino

Nesta semana em que se inicia o inverno, uma nova calamidade natural transbordou subitamente o litoral e o interior de dois importantes estados do Nordeste. A seca, portanto, não é a única e absoluta tragédia que deixa milhares de nordestinos desabrigados e desprovidos de inumeráveis meios de subsistência. Pessoas comuns, todos cidadãos brasileiros e nordestinos, estão vivendo em condições extremamente precárias, de improviso, espalhadas, reciprocamente, em 95 municípios – quase 100 – do Agreste e da Zona da Mata (litoral) de Alagoas e de Pernambuco, pela força das enchentes que ocorreram nessas duas unidades federadas da região.

O povo nordestino, apesar de ser um povo extremamente sofrido pelas secas e, agora, pelas enchentes, vive em perfeita e ilimitada consonância com os aspectos naturais e culturais, caracterizados pela magnífica coexistência de diversidades. Seu fabuloso mosaico climatobotânico – integrando os climas e suas respectivas vegetações –, sua perpétua rede hidrográfica, tendo como carro-chefe o Rio São Francisco, o rio da integração nacional, e sua criativa manifestação artística – patrimônio histórico, folclore, carnaval, música, literatura, culinária e outros elementos multiculturais – fazem do Nordeste uma das belas e ricas regiões do Brasil.

É muito deprimente ver a outra face da nossa simultaneamente rica e pobre região, assolada por uma fortíssima tempestade tropical provocada por chuvas que não param de cair; é muito deplorável observar um amontoado de construções destruídas pelas enchentes em zonas urbanas de municípios. Veja o desastroso saldo divulgado parcialmente pelas Defesas Civis dos estados atingidos: 52 mortes – compartilhadas entre Alagoas (35 mortos contabilizados) e Pernambuco (17 mortos) –, 157,5 mil desabrigados e dezenas de indivíduos desaparecidos. Uma realidade que se aproxima dos sinais dos tempos. Um novo apocalipse, por sinal, já está aí, criando uma quantidade incomensurável de vítimas.

Pessoas que coabitam com a pobreza extrema nos lugares afetados pelas chuvas também convivem com as incômodas transformações causadas pelo temporal neste início de inverno. Além de possibilitar a perda contínua e progressiva de moradias populares, na maioria pobres, e modificar a aparência das paisagens urbanas e rurais dos municípios, as últimas catástrofes estimularam a crescente proliferação de doenças infectocontagiosas, como a leptospirose – causada pela urina de ratos – e a cólera. Qual foi a resposta para o surgimento de epidemias nesses locais? Vômitos e diarreias, já que as enchentes propiciam a expansão de enfermidades diretamente vinculadas ao clima tropical.

Sob a nova avalanche de temporais que acabaram de penetrar em dezenas de cidades, milhares de moradores lamentam ininterruptamente ao verem suas residências total ou parcialmente destruídas, seus móveis rompidos, seus eletrodomésticos quebrados, seus alimentos e seus vestuários em falta, seus estabelecimentos comerciais destruídos, e suas pequenas e médias cidades ilhadas. Essa hodierna tragédia criada pelo mau tempo é, obviamente, uma das circunstâncias integrantes do avassalador apocalipse brasileiro. Consequentemente, eles mesmos, nordestinos valentes, suplicam a Deus por socorro e por novas vidas, cada vez melhores.

Queremos ver, nos próximos anos, as cidades alagoanas e pernambucanas com sua perspectiva modernizada, com sua vida normal restabelecida e com seu pleno vigor restaurado, após esse trágico acontecimento que entrou não somente para a história do Nordeste, mas também para a história da natureza e da humanidade brasileira. Esperamos que parcelas vindouras que integram a corajosa e batalhadora população nordestina não sejam invadidas pelas enchentes, propícias nas sub-regiões do Agreste e da Zona da Mata, onde o clima é mais úmido que no Sertão. Porém, no Agreste, as chuvas ocorrem com frequência intermediária por ser uma área de transição entre o Sertão semiárido e a Zona da Mata.

Território de gente socioeconomicamente desigual, contudo alegre, vencedora e capaz de conseguir, com liberdade, otimismo e veemência, oportunidades para superar os problemas diuturnos, a região nordestina valoriza suas essências e suas raízes. Seu povo, neste momento, encontra-se unido em todos os nove estados e fielmente consciente, com o objetivo de reerguer suas perdas materiais e melhorar suas condições higiênico-sanitárias, colaborando para seu aprimoramento vital. Nosso povo, um dos mais orgulhosos do país, não é culpado, nem inocente e nem escravo de um determinado proprietário. É apenas servo de um só Senhor, o Criador.

O Governo Federal, representado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva – um pernambucano ilustre e preocupado com o povo mais humilde –, o Corpo de Bombeiros e várias organizações de todos os cantos do Brasil e até da Venezuela estão se mobilizando deliberada e voluntariamente para socorrer as vítimas das enchentes que devastaram dezenas de municípios do Nordeste, todos localizados em Alagoas – estado onde a situação é gravíssima – e em Pernambuco. Destruição monumental que acumulou prejuízos para a população local, fazendo com que sua sobrevivência dificulte ainda mais. Temos convicção de que esse problema é apenas temporário, e que a vida dos mais necessitados irá retornar gradativamente.

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